com uma grande paz eu sonho já até a cor da barca
é da cor dos meus rios interiores e do meu mar
azul.
morri já tantas vezes que perdi a vontade de ressuscitar.
art by Ottavia Rizzo (Baccante-Brilla)
com uma grande paz eu sonho já até a cor da barca
é da cor dos meus rios interiores e do meu mar
azul.
os meus olhos partidos de boneca, choram todos os filhos que esqueceram a palavra mãe.
os meus olhos de mulher envelhecida, fixam o palco. - enquanto a barca não vem.
foto de madalena pestana
a todos os amigos que pensaram, mandaram mails e visitaram este espaço, durante esta fase de olhar baço.
não falo dos cigarros e explicações de Sócrates - o puritano, porque...não me ocorre nada (sempre que penso nele).
Vasco, meu conhecido, não acredito que amigo, os meus parabéns pela tua iniludível inteligência, tanto a avaliar o acordo ortográfico como a desmontar as ridículas desculpas de Sócrates por ter fumado um cigarro.
Vasco, porra, em que catequese andaram eles????!!!
Parabéns, meu escorpião de uma figa! :D
meu caro Senhor Sócrates, é com grande esforço que alinhavo estas linhas, aqui na Junta de Freguesia, porque o dinheiro para a Net já o Senhor me comeu todo em impostos e, estou tão cega como a menina da imagem acima, ainda com a agravante de não ter a idade dela e ter de trabalhar até poder, por ordem sua, para tapar o buraco do défice que meia dúzia de cromos criaram para o País total. porque à minha também deficitada conta bancária é que o dinheiro da Europa nunca foi parar.
isto para dizer que pela primeira vez usei o meu direito aos hospitais civis. urgência de oftalmologia. se não fossem as dores, ia a sorrir porque ia encontrar médicos competentes e... SIMPLEX.
o 1º médico podia até ser competente mas... estava a pensar numas perdizes em azeite que o esperavam e aos amigos para uma patuscada ao almoço, antes de ir facturar para a clínica privada. paguei dez euros por esse prazer e mais remédios, que me permitiram trabalhar quinze ou mais dias a ganir com dores, até rebentar outra úlcera.
8.30h am. - desta vez foi um médico, ainda não habituado a perdizes, felizmente. olhou. medicou, mandou tapar o olho (tudo o que o outro não fez...). mais dez euros. novos remédios e os outros para a reciclagem...
depois foi só SIMPLEX...
andar cega pelos passeios cheios de automóveis. fazer compras para sobreviver uns dias e ter de pedir no supermercado que me ajudassem, que fossem os meus olhos (eu não tenho família, Senhor Sócrates, não sou rica, tá a ver?...).
10.30h am - fui ao serviço. a esse fui lá pelo tacto. mais de vinte anos a viver ali. mas convinha que me vissem, não fossem pensar que era ronha. instalou-se de novo na nossa sociedade a desconfiança geral. obrigada, nosso Primeiro.
a seguir foi mesmo SIMPLEZ. caramba, até que enfim ia conhecer o tipo!
a baixa era necessária, que com os olhos tapados pode-se até votar mas, ainda ninguém computa e a ordem era penumbra total.
- volte cá às 2.30h (pm) para marcar consulta. para baixa tem de ser com o médico de família.
já a tremer de dor apontei para o olho, ao autómato falante.
- vá ali ao balcão pode ser se elas...
SIMPLEX. fui.
- ah, o seu médico hoje está no complementar. venha cá às 3h da tarde e tente falar com ele. mas venha mais cedo a ver se o apanha antes de começar as consultas. ele tem de autorizar por escrito.
- obrigada - respondi porque fui educada assim.
cheguei a casa onde a cadela esperava uma carícia e eu nem a via. atirei-me para a cama a soluçar. de dor. de solidão e de SIMPLEX.
às 4 horas da tarde tinha a baixa na mão. o médico, pelo menos, foi decente e desceu para tratar ele da autorização, sem eu ter de subir e descer mais duas vezes do r/c ao segundo andar e vice versa.
agora era só ir de novo à farmácia. atravessar as ruas pejadas de carros (mande abrir mais pontes sábio Sócrates!), encontrar o poste de correio para mandar o papel da baixa ou, nem um chavo, já sem ver nada e esperar que um táxi me visse a mim através dos carros mal estacionados, sem me passar por cima.
consegui. SIMPLEX!
o código de conducta? deduzam o que quiserem.
ainda liguei para o serviço a dar a data da baixa.
- melhoras. vamos precisar do papel...
- pois...
caro Sócrates, o segundo, que o Primeiro foi sábio de facto. assim não. e esta é só uma de muitas que, por estar a ditar, não posso dar-me ao luxo de abusar.
em si não voto MESMO. eu e muitos. leve o SIMPLEX para casa e volte a ser engenheiro. quem sabe nisso é bom?...
eu, nem que seja para não me abster. voto até no Jardim quer seja candidato ou não. pelo menos diz asneiras e faz rir.
Senhor Sócrates, mais deprimente que a sua governação só me lembro do antigamente. e outra vez o mesmo, NÃO!
sempre a considerá-lo.
madalena
PS _ SIMPLEZ II _ a receita de perdizes em azeite
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leitura do dia:
Poema enjoadinho
caiu ____ a última gota
não há espanto nem revolta
caiu ____ no dorso do tempo
com o silêncio como escolta
nada ____ consigo o prodígio
de ter o cérebro vazio
ter mais ____ nada ____ para dizer
aspiração ____ absoluto
descanso mais que merecido
uma palavra ao ouvido
de quem passar por aqui
- Enquanto a Barca não vem
façam Amor ___ sejam Paz
incomodem toda a gente
destronem a hipocrizia
derramem tanta ____ alegria
como dor ____ no rio corrente
esse ____ o que vai dar ao mar.
única urgência
- a mesma fúria ____ boa ____ Adolescente!
no amar ____ e no lutar.
Madalena Pestana
photo by yannic schon
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foto de madalena pestana
numa só mão. a minha mão ou outra. fechada. a vida cabe. toda ela.
a vida cabe. a minha. vida nada. vida vazio. espaço. ar. numa só mão.
o voo de pássaro que sonhei ser morreu. as flores que quis nascer
floriram. longe a mim.
o rio que navegava. secou. por baixo dos meus olhos. tanto era o sal
que deles se entornava.
a vida. a minha vida. hoje. cabe numa só mão. num só punho. cerrado
de quem não quer perder o pouco que sobrou. ar. nada. tudo. ar
que por ser ainda respirável. há-de fugir daqui. da minha mão. infértil.
e ir juntar-se ao vento. ser útil. bem distante. fora de mim. do nada.
ser vida. ar salvação. em qualquer uma boca.
em deserto _____ nú
rolo. rolo. rolo. rolo.
que raio de vento és tu?!
com as mãos ____ aquelas mãos ____ vazias sempre
faz com a Terra um acordo ____ de mães ____ desesperadas
quando a chuva cair____ aqui ou no deserto
no inferno que seja____ irá buscá-la
e entregará aos rios____ todas as gotas____ nada entornará
para que encham o mar
o imenso mar ____ que em ondas ____ lhe aceitará ____em troca
a infindável mágoa ____carregada ____nas mãos
vazias ____como a morte.
__ **__
o entranhado desejo satisfeito _________ à tua revelia _________ e renovado
ao ver nas tuas costas a montanha _________ solo erguido _________ vertebrada
___________
sopra meu vento ---- amor ---- ao meu ouvido
cerca-me o pescoço duma ---- serpente ---- amante
sibilante
que me faça tremer e ---- oscilar ---- perder no
espaço
que medeia entre o ---- odor ---- de ti no meu
pescoço
e o beijo que desejo
e tu ---- inventarás ---- num sopro criativo
sopra. amor. a palavra. ao meu ouvido
e em ---- enrolo ---- de cobra que volteia
deixa depois de ---- verdadeiro ---- amor
a minha boca cheia.
mas a cabeça doía mais que o pensamento e fui dormir. trazia na memória um olhar que não parecera ver-me. nem sequer sabia que o trazia. as coisas que se carregam para casa sem saber!
pior, pior foi o sonho depois.
- no emprego, alguém com poder para isso e muito mais, avisava-me, olhando-me como quem não me vê, que já não precisavam de mim. assim a frio e pronto. rápido como os sonhos são. segurei uma tampa de caixa de papelão. coloquei por cima as minhas plantas e saí a informar não me lembro quem. ou lembrarei?
voltei ao local de trabalho que por vinte anos fora o meu. ia saber de mais. do como. do porquê. mas a secretária já fora trocada. esperavam ainda quem a ia ocupar e... não me viam. ninguém sequer olhava na minha direcção.-
nunca me senti tão número como neste sonho. um número apagado. um número para engrossar, e ainda assim pouco, uma futura estatística qualquer.
a minha cadela foi acordar-me. entendi que era sonho. era sonho mas até quando o era?
assim deixei o texto de amor inventado e parti na direcção da barca que o sonho parece anunciar.
não a avisto mas sei que não demora. é mais de indiderença que de doença que se morre. sei o que digo. antes o não soubesse.
não tenho pena de partir. não gosto é de esperar.
hoje não vejo telejornais. falam de desemprego. não sei é como apagar da memória aquele olhar.
trouxe também memórias do Mar onde nadaste, meu amor de sempre a sempre. coisas pouco sabidas. coisas de que me orgulho. sabia de ti e da tua maldição de teres nascido português.
amei naquela hora o homem quase estranho, não fora ele um nome doce de ouvir na tua boca. amei-o como se o tivesses enviado.
e não terás? que sabemos nós do para lá disto a não ser que "anda tudo ligado"*?
quero que o homem volte. que me conte de ti antes de mim. também é para isso que servem os amigos - para nos manter vivos depois do tal adeus.
* in Square Tolstoi de Nuno Bragança.
para ti - meu Amor último. meu abuso do sonho. meu pretexto de vida...